Todo o dia do trabalho é de triste lembrança para os fãs de automobilismo no Brasil. Foi em um domingo, primeiro de maio de 1994, que morreu Ayrton Senna da Silva, um dos maiores ídolos esportivos que o país produziu.
Para muitos, Senna era quase Deus. Quando ele surgiu, pilotando pela modesta Toleman, em 1984, era mais um brasileiro tentando a sorte na principal categoria do automobilismo. Mas a corrida que realizou em Mônaco mudou sua história e a do Brasil na Fórmula 1. O GP foi encerrado antes da hora devido às condições do tempo. Mesmo sob chuva, Senna se aproximava de Alain Prost e tinha boas chances de vitória. Ele mostrou arrojo e grande qualidade técnica.
Da Toleman para uma equipe grande era questão de tempo. Vieram a lendária Lotus, a poderosa McLaren e a revolucionária Williams. Foram 10 anos de carreira, 3 títulos mundiais e feitos incríveis que elevaram seu nome ao panteão dos grandes do esporte na História.
Para os brasileiros esses 10 anos de Ayrton Senna significaram muito mais que conquistas esportivas. O país saía da ditadura militar, vivia uma época de esperança, mas também de muitas dificuldades. Era a década perdida. Economicamente estávamos quebrados, a inflação era altíssima e as ações para mitiga-la foram improdutivas. Era uma crise atrás da outra. Veio a primeira eleição direta para presidente após quase 30 anos, Fernando Collor foi eleito e pouco mais de dois anos após a posse renunciou, assolado por denúncias de corrupção.
Nada dava certo no Brasil, exceto Ayrton Senna. Conseguíamos conquistas esporádicas em outros esportes. O ouro do basquete no Pan de Indianápolis foi incrível, as vitórias de Adílson Maguila Rodrigues nos confortavam e o título Mundial de Nelson Piquet em 1987 foi muito comemorado, mas o futebol, carro chefe do país, não ganhava uma Copa desde 1970. Enfrentava um jejum cruel. Só Senna com seu carisma nos lavava a alma domingo após domingo.
Era um herói, invencível. O retrato do Brasil que todos almejavam. Até primeiro de maio de 1994… Foi uma dor nacional. O Brasil parou para chorar e reverenciar Senna. E parece incrível, que depois desse fatídico domingo em Ímola, grandes notícias começaram a assolar o país. Veio o Plano Real, a inflação foi domada. Retomamos o caminho da democracia, com altos e baixos, mas firmes no propósito da liberdade. Até a Seleção voltou a ganhar uma Copa do Mundo.
O que me dá a certeza de que Senna tem uma importância mais significativa do que simplesmente alegrar o país com suas conquistas. Elevou nosso moral em uma época muito difícil. Mostrou que apesar de todas as dificuldades que enfrentávamos, era possível vencer. E tinha que acontecer exatamente nestes dez anos, entre 1984 e 1994, para que não deixássemos a peteca cair. O estado de espírito do brasileiro se fundiu com as vitórias de Ayrton Senna. Poucos conseguem isso. Podemos pensar em qualquer área de atuação. Quem mais?
Ainda vale acrescentar um detalhe: ele se preocupava com o país. Não vivia em uma bolha. Tinha noção das dificuldades que o Brasil enfrentava e lutou contra elas a seu modo. Tornou-se um ídolo nacional. Tinha defeitos e qualidades como todo ser humano, mas mostrou mais virtudes que erros. E era disso que o Brasil precisava naquelas manhãs de domingo. Viva o primeiro de maio. Data de lembrarmos e reverenciarmos Ayrton Senna.